O álcool é a droga mais consumida no mundo. Dados recentes da Organização Mundial da Saúde revelam que aproximadamente 2 bilhões de pessoas consomem bebidas alcoólicas (Global StatuS Report on Alcohol 2004). Seu uso indevido é um dos principais fatores envolvidos na diminuição da saúde mundial, sendo responsável por 3,2% de todas as mortes e por 4% de todos os anos perdidos de vida útil. Quando esses índices são analisados em relação à América Latina, o álcool assume importância ainda maior. Cerca de 16% dos anos de vida útil perdidos neste continente estão relacionados ao uso indevido dessa substância, índice quatro vezes maior do que a média mundial.
A formulação de políticas e de ações integradas e baseadas em evidências requer a realização de estudos epidemiológicos que avaliem e mapeiem o problema. Esse tipo de procedimento é rotineiro em países desenvolvidos, onde órgãos como o National lnstitute on Drug Abuse (NIDA), dos Estados Unidos, e o National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (NIAAA), também americano, realizam levantamentos periódicos com representatividade nacional.
No âmbito nacional, iniciativas anteriores, como o Levantamento Domiciliar sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil, uma parceria entre o Centro Brasileiro de Informações Sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID) e a Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP, contribuíram de maneira significativa para o dimensionamento da problemática do uso de substâncias em nosso país. No entanto, faltava um retrato mais específico e preciso da população geral em relação aos padrões de consumo de álcool.
O I Levantamento Nacional sobre Padrões de Consumo de Álcool na População Brasileira (2006), uma parceria entre a Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e a Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (Uniad), do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), foi idealizado para cumprir esse papel. O estudo permitiu desenvolver parâmetros objetivos para quantificar o padrão de consumo do álcool, os problemas relacionados a esse consumo, tais como a violência, a doença mental e outros problemas sociais, e o impacto entre jovens e demais faixas etárias da população brasileira, levando em consideração as diferenças regionais.
O compromisso com a representatividade no âmbito nacional é fundamental para a geração de dados fidedignos. Os cuidados com a amostragem são extremamente importantes para atingir esses objetivos. Para tanto, adotou-se metodologia similar aos estudos realizados nos Estados Unidos, na Europa e aos estudos mais rigorosos feitos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a metodologia probabilística estratifica, considerada "padrão ouro" em pesquisas desse tipo.
Os resultados obtidos permitiram desmistificar vários aspectos relacionados ao uso desse tipo de substâncias no país. A precisa definição do número de abstinentes na população brasileira é exemplo disso. Por anos, divulgou-se que 10 a 20% dos brasileiros não bebiam. Entretanto, esse estudo mostra que uma proporção muito maior, 48%, mantém-se abstinente. Por outro lado, 25% da população bebe de forma a comprometer a saúde. Portanto, o estudo retrata uma realidade mais complexa do que supúnhamos. Vivemos num país no qual, por um lado, observam-se altas taxas de abstinência e, ao mesmo tempo, altas taxas de uso nocivo.
Com relação aos adolescentes, esse mesmo estudo mostrou tendências inesperadas. O uso precoce e abusivo do álcool pelos jovens era uma realidade previsível. Entretanto, observou-se que o consumo das meninas está se aproximando do uso dos meninos, embora eles ainda tenham um consumo mais pesado do que elas. Além disso, cerca de dois terços dos indivíduos dessa faixa etária são abstinentes. Por outro lado, metade dos que bebem consumiram 3 doses ou mais por situação habitual e quase um terço dos meninos que bebem consumiram 5 doses ou mais, ante 11 % das meninas. A quantidade de álcool consumida pelo adolescente em cada episódio é tão' importante quanto a freqüência com que bebem. Isso se deve à maior suscetibilidade apresentada por seus cérebros, ainda em processo de formação. Portanto, especial atenção deve ser dada a esse tipo de informação em pesquisas dessa natureza.
Esse é um retrato do consumo de álcool no Brasil. A necessidade, tanto de maiores controles sociais para estabelecer regras de comercialização e utilização do álcool, como de ações públicas no sentido de regular esse mercado é evidente. Felizmente,a pesquisa demonstrou que a sociedade brasileira está pronta para essas medidas e apóia as principais ações regulatórias já adotadas em outros países.
O caráter inédito desses dados, particularmente no que se refere à sofisticada metodologia de amostragem, se por um lado inviabiliza a comparação com levantamentos anteriores, por outro lado permitirá o monitoramento dessas informações no futuro com relação às políticas públicas aplicadas no período.
Este estudo foi conduzido por Sandro Sendin Mitsuhiro e Ronaldo Laranjeira, respectivamente Vice-coordenador de Instituto Nacional de Políticas Públicas do Álcool e Outras Drogas e Chefe da Disciplina de Psiquiatria Clínica do Departamento de Psiquiatria da Unifesp.
Parte deste artigo foi publicado em "SOCESP em destaque".
Neste espaço você vai encontrar questões que de alguma forma originaram o próprio nome do Blog e estaremos abordando as questões da Saúde e da Tecnologia da Informação, ou a mistura das duas, enunciadas como textos e imagens. Esta imagem panorâmica foi capturada pela sonda Phoenix Mars Lander em 10 de Junho de 2008 no 16º dia após o pouso na superfície de Marte e em primeiro plano vemos seus painéis solares e o braço robótico. Credit:NASA/JPL/University of Arizona,Tucson. E não é bobagem...
Por outro lado, a imagem do plano de fundo foi feita pela Curiosity Mars Science Laboratory em 08 de setembro de 2012 no 33º dia após o pouso na superfície de Marte observando-se o solo marciano como jamais foi visto. E também não é bobagem...
Image credit: NASA/JPL-Caltech/MSSS.
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